Papai se foi...
Foram 5 anos de muita luta. O estado de saúde dele começou a descender há exatos 5 anos. Hemodialise diária, emagrecimento de um total de 40 kilos, cancer na laringe, traqueostomia, (perda total da voz) marca passo, problemas no intestino, falta de apetite, anemia e o mais devastador: uma depressão muito grande.
Acho que proporcionamos tudo e tentamos de tudo para melhorar e tentar curar cada um dos problemas que iam surgindo. E ele, não sei como, sobreviveu a todos estes obstaculos. Acho que no fundo queria viver, mas talvez se revoltasse com o estado que estava. Ele nunca foi de falar muito sobre sentimentos, mas nós familia, mesmo sem a comunicação direta, chegamos a várias conclusões. Foram decepções em alguns campos da vida, com amigos, com trabalho, com uma relação desgastada, com a perda da sua irmã. Dai as doenças vieram.
Estes anos foi triste ve-lo neste estado... sem comunicação, sem força, sem vontade de viver e lutar.
A maior guerreira e lutadora neste tempo todo foi minha mãe. Que apesar de alguns perrengues emocionais na vida com ele, estava lá, entregue, dedicando -se incansavelmente pela sua recuperação e bem estar. O que ela fez por ela, só nós sabemos, ou melhor, por mais que achamos que ela fez além do que qqr pessoa faria, ela deve ter feito mais. Pela bondade, companherismo e muito mais. Ela merece toda consideração e agradecimento de toda familia.
No dia 20 de julho ele foi pro hospital com uma pneumonia. Dia 01 de agosto ele se foi. Dormindo. Ele ficou uma semana na UTI e depois teve a alta pro quarto.Apesar de estar ainda muito debitado, estavamos com esperança de uma recuperação lenta. Confesso que com muito medo de possiveis sequelas e de como seria dificil estes passos pra trás na saúde dele já que já era bem fragil. No quarto ele melhorava devagarzinho. Sua aparencia que não era boa. Magrinho, pele e osso. Sofria de ver. A comunicação (por leitura labial) estava prejudicada. Esses dias que fui visita-lo ele pegava na minha mão e agradecia. E eu respondia: obrigada por que? (será que ele já sabia que seus dias estavam chegando ao fim???) Na quarta, sai do meu trabalho e fui direto pra lá. Mal sabia que seria pela última vez. DEpois de algumas horas que sai do hospital ele se foi...
Quero deixar registrada como foram estes 15 minutos ultimos com ele. Entrei no quarto , ele estava sentado na poltrona e disse que tinha ido lá pra levar ele de volta pra casa. Ele esboçou um sorriso e disse: Verdade mesmo? Eu disse que sim: Vamos? E ele disse: vamos. Dai falei que era brincadeira mas que logo mais ele ia sair, mas que precisava se esforçar, se fortalecer, comer. Eu dei parabens pra ele dizendo que mais uma vez ele estava saindo desta. Conversamos bem pouquinho e ele queria deitar de volta na cama. Estava cansado de tantas horas estar sentado. Esbravejou que os enfermeiros demoravam tanto sempre pra atender. Deitou na cama, reclamou um pouco de dor de barriga (?). Deitou de lado e sai fora do quarto com a mamae. Qdo decidi ir embora ele tava dormindo, dai nem dei tchau. Mas sai confiante. No meio do caminho passei uma msg pro medico agradecendo tudo e sobretudo pelo esforço que eles fariam pra a gente conseguir uma home care pra ele, onde seria uma chance de reabilitação geral. Voltei pra casa. Dormi. O telefone toca quase 6hs da manhã. Minha mãe gritando. Ele não acordou. Gritei. Chorei. Liguei pras minhas irmãs. Fui pro hospital. Foi o dia mais triste da minha vida. Cheguei lá, ele já estava coberto ainda no quarto. Minha mãe devastada, Só nos abraçamos e choramos. Ele se foi. Que dor a nossa. Parece que arrancaram um pedaço da gente. Minhas irmãs chegaram. A familia chegou. Levaram o corpo. Cenas tristes mesmo. Incorformadas de ve-lo num caixão. eu não quiz me aproximar dele. Na sequencia, cemiterio, velorio e enterro.Uma semana de shiva. Ontem a cerimonia dos 30 dias no cemiterio. Nossa... faz um mês isso tudo, ainda estamos inconformadas. Uma fala de consolo é que ele estava mal, talvez sofrendo, mas não sei se isso consola. Ele tava maus sim, mas a gente tinha uma esperança que ele melhorasse.
Nossa relação não posso dizer que era mil maravilhas. Não era.Tive tb algumas mágoas, algumas discordancias com atitudes deles. Mas em 40 e poucos anos de convivencia, a gente amadurece e procura entender um pouco o lado deles ou tenta aceitar, já que não dá pra mudar. E com essa perda, passo a entender ainda mais que a gente não precisa pensar igual, não precisa se abraçar, trocar palavras carinhosas pra afirmar o nosso forte vinculo e amor. A sensação é que morreu uma parte de mim.
Agora é lembrar de muita coisa boa que ele passou, que viveu. Ele gostava de viver. Gostava da natureza, de passarinhos, de cachorros. Gostava de gente. Era uma pessoa que fazia o que bem entendia, não gostava de regras. Não seguia os costumes como devia, como seguiam seus conteraneos sefaradim. Era uma pessoa que se apegava com pessoas mais simples, com pessoas de religiões opostas. Gostava de festejar seu aniversário, gostava de ir pra Israel todo ano. Gostava de pescar. Gostava de comer, e muito bem. Era generoso. Distribuia dinheiro pra quem fosse. Ajudava muitas pessoas. Respeitava muito sua religião. Era divertido. Piadista. Foi um bom pai. Poucos atritos com a gente durante nossa adolescencia, não se metia, não brigava. Nas varias viagens que fizemos pra fora do Brasil escrevia semanalmente cartas e postais pra a gente. Foi feliz. Deixou muitos ensionamentos e parte de nossas personalidade com certeza de exemplos. VIVER A VIDA.
Que ele descanse em paz, que sua alma se eleve e onde estiver que saiba que estamos com ele em pensamento, pra sempre..